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Porque manejar as florestas naturais amazônicas significa conservá-las

A madeira oriunda de florestas naturais é a principal fonte de arrecadação de recursos e de geração de empregos em muitos municípios da Região Amazônica, sendo decisivo que o manejo seja implementado de forma sustentável, para a manutenção dessa atividade em longo prazo. Assim, extrações sustentáveis são importantes para a manutenção da continuidade do desenvolvimento regional.

Para os produtores de madeira de florestas naturais é importante saber o método adequado para o planejamento da extração no primeiro ciclo, de forma a garantir uma recuperação de volume de madeira semelhante para exploração no ciclo seguinte. Para os órgãos fiscalizadores, por sua vez, também é importante que as extrações de madeira não comprometam o potencial produtivo das espécies comerciais de determinada região. Lacunas no conhecimento sobre o manejo sustentável, como embasamento científico, têm acarretado legislações restritivas que dificultam seu avanço técnico.

O manejo florestal tem sido severamente criticado nos últimos anos devido a confusões conceituais relacionadas à produção madeireira. São frequentes imagens de área após corte raso associadas de forma equivocada ao manejo florestal. Existe também a confusão entre manejo florestal e exploração sem planejamento e/ou ilegal.

No entanto, o manejo florestal é provavelmente a atividade de uso da terra mais fiscalizada e monitorada. Cada árvore passível de manejo é localizada no terreno em mapa que informa suas coordenadas, sendo identificada botanicamente e suas dimensões aferidas. O órgão fiscalizador pode a qualquer momento verificar junto ao produtor, onde, quando e se a árvore será manejada. Além disso, pode também conferir o estoque previsto para exploração, visando garantir a recuperação dessa extração no futuro.

O manejo de florestas naturais é a única atividade relacionada ao uso da terra que mantém a cobertura florestal praticamente intacta. Pouca gente sabe que, em média, 88% das árvores de uma área sob manejo são mantidas na área. As normas de manejo são bem claras: só é permitido cortar árvores com mais de 50 cm de diâmetro. Isto implica que somente 12% da estrutura podem ser cortados, pois a maioria das árvores em uma floresta natural está abaixo desta classificação. Esta é a principal vantagem direta do manejo florestal: mantém a floresta praticamente intacta.

Fato concreto e já observado cientificamente é que em áreas mantidas como florestas (ou seja, onde não houve sua remoção mediante corte raso) e que foram exploradas sob manejo, ou mesmo sofreram retiradas eventuais de árvores visando seu uso na manutenção ou construções na própria propriedade rural, continuam com padrões semelhantes ao que possuíam 40 anos atrás. As mesmas espécies exploradas no passado continuam com o mesmo padrão estrutural.

Como é feito

Os talhões de manejo (compartimentos das “áreas de exploração anual”) na Amazônia variam de 500 a 1.000 hectares e os ciclos de 25 a 35 anos. Isto significa que, em média, áreas com mais de 500 hectares ficarão em “pousio” (repouso referente ao ciclo) por no mínimo 25 anos! Imagine os benefícios e proteção que isto pode trazer para a fauna e biodiversidade local? A área torna-se praticamente um “santuário” para a fauna durante 25 anos! E quando houver nova intervenção, esta será de poucos meses, pois é o período normal das atividades anuais de manejo no talhão em exploração. Além disso, existem técnicas chamadas “exploração de impacto reduzido”, as quais reduzem muito os danos eventuais, causados à floresta pela exploração. A Embrapa tem participado no desenvolvimento e aprimorado de técnicas de exploração de impacto reduzido nos últimos anos, em resposta à crescente demanda da sociedade.

Algumas questões são levantadas, como por exemplo, se haveria erosão genética na floresta explorada segundo estas normas. Vários trabalhos já avaliaram que o manejo não causaria esta perda, pois a exploração normalmente ocorre em diâmetros que são obtidos somente por árvores mais velhas, ou seja, na faixa de culminação do desenvolvimento da população da espécie considerada. Se forem avaliadas árvores com mais de 50 cm será possível observar que, dependendo da espécie, haverá amento proporcional de podridões, ocos e problemas fitossanitários nas árvores. Ou seja, elas já atingiram seu apogeu e agora iniciam sua fase de senescência, ou seja, decrepitude. Portanto, sua remoção não colocará em risco a recuperação futura da floresta manejada.

Porque manejar

Uma floresta natural sem manejo é um caos onde várias espécies de diferentes dimensões competem por espaço vital, principalmente buscando mais luz. Várias espécies têm sua regeneração natural dificultada devido ao pouco acesso à luz, ocasionado por árvores muito maduras, com copas grandes e já em avançado estado de velhice. Estas árvores velhas podem comprometer a regeneração e o desenvolvimento das mais jovens, as quais ficam em permanente estado de supressão. Este ciclo é quebrado até que a queda de uma árvore abra uma clareira. Com isso, possibilita a germinação e o crescimento das novas mudas.

A baixa regeneração nas classes menores pode ser verificada em várias estruturas de espécies em florestas primárias. Portanto, a remoção das árvores mais velhas pode favorecer a regeneração das espécies arbóreas e ser a garantia de sua manutenção. Além disso, estudos informam que as florestas secundárias capturam carbono aproximadamente 10 vezes mais que florestas primárias.

O que diz a legislação e a ciência

A legislação florestal, busca a preservação das florestas. No entanto é fechada, definindo intensidades de exploração de maneira genérica e arbitrária, de acordo com critérios únicos para espécies de diferentes grupos ecológicos, estruturas na floresta e ritmos de crescimentos distintos. Isto pode surtir efeito negativo, podendo pôr em risco a sustentabilidade almejada.

É evidente que o manejo de florestas naturais é uma atividade complexa e que muitas melhorias podem ser acrescentadas. Por exemplo, ainda são poucos os dados disponíveis sobre o padrão de crescimento de espécies comerciais e, consequentemente, do ciclo ideal de corte que deve ser utilizado. Quando os ciclos, limites de diâmetro de corte e taxas de extração são genéricos, pode-se acertar para algumas espécies, mas errar para a maioria. Todas estas variáveis deveriam ser determinadas cientificamente por espécie ou grupo de espécies.

Por exemplo, analisemos a questão do diâmetro limite de corte. Cada espécie possui um diâmetro onde maximiza seu incremento. Fazendo um paralelo, pode-se aplicar a mesma lógica de avaliação usada para a criação animal para corte, apresentando seu momento ideal de abate. Se ultrapassarmos este diâmetro onde é maximizado o incremento, a espécie apresentará redução de produtividade. Ou seja, passa a não ser interessante economicamente. Obrigar o produtor a cortar depois deste momento, é obrigar o produtor a esperar que sua floresta fique mais estagnada, ou seja, menos produtiva.

Por outro lado, cortar antes do diâmetro ideal implica não aproveitar todo o potencial da espécie, reduzindo o incremento futuro e pondo em risco a estrutura da floresta sob manejo como um todo.

Então, os incrementos de uma floresta, considerando o conjunto de suas espécies manejadas, são variáveis e não fixos. Lembrando que, se usarmos diâmetros ótimos de corte que maximizem o incremento das espécies que manejamos, obteremos melhor incremento total. Como vantagem adicional do manejo é ter uma floresta sempre nova e pujante, pela renovação estabelecida a partir da extração das árvores mais velhas.

Obviamente, a identificação destes diâmetros ideais é função da pesquisa. Sobre esta questão, a Embrapa Florestas tem se dedicado nos últimos anos em suas pesquisas no estado de Mato Grosso e já tem indicativos para várias espécies comerciais.

 

O resultado esperado

O grande potencial para aplicação do manejo, independente de sua importância econômica, é para a manutenção de grandes áreas com cobertura florestal. Sua manutenção garante, não apenas a conservação de sua biodiversidade, mas também os serviços ambientais da floresta, como manutenção do solo, absorção da água das chuvas, colaborando com os mananciais, proteção às nascentes, dentre outros.

Assim, o estímulo ao manejo de florestas naturais possibilitaria a manutenção de mais áreas com florestas nativas. Somente no estado de Mato Grosso, por exemplo, considerando o bioma Amazônico, existe cerca de 30 vezes mais floresta que todas as concessões florestais em atividade em toda a região da Amazônia. Isso mostra que o manejo como atividade para proteção das florestas é uma realidade concreta e deve ser, portanto, estimulado além concessões, ou seja, promovendo-se o aumento do número de planos de manejo.

Instituições não governamentais de renome internacional que se dedicam à proteção e conservação das florestas já entenderam que estimular o manejo é estimular a manutenção de florestas e, por esse motivo, têm se envolvido em projetos com este objetivo.

O entendimento destes fatores e das pesquisas deverá resultar em curto prazo em duas vertentes importantes:

1 – Melhoria da qualidade técnica e científica do manejo de florestas naturais;
2 – Ajuste da legislação às novas informações cientificas.

Uma legislação mais ágil e adaptada às necessidades do manejo garantirá a adição imediata de milhares de hectares de florestas naturais produtivos e conservados.

Texto: Evaldo Muñoz Braz e Patrícia Povoa de Mattos, pesquisadores da Embrapa Florestas

Revisão: Daniela Torezzan – Assessoria do FNBF